segunda-feira, 28 de abril de 2008

Das Tempestades


A chuva forte desabava lá fora. Relâmpagos rasgavam o céu escuro, trovões retumbavam na noite. Tudo era violência e fúria. Até o céu reclamava. Até a noite ensurdecia o silêncio. Raios que repudiavam a escuridão.
O telefone não tocava. O espelho refletia a imagem e ainda assim não importava. Há pouco ela trancara a porta. Ninguém passaria mesmo por ela.
A chuva caía furiosa. As flores no vaso morreram e ela não ousava jogá-las fora. Uma pilha de roupas largadas num canto do quarto. O descaso. Fotos na parede, na sala, as roupas dele que empilhara junto com as dela, a toalha usada no banheiro. Não queria tocá-la. Ainda não suportava a ausência. Dele, nem sinal de fumaça. Ela, que não mais caminhava em sua direção, permanecia imóvel na cama onde ele não se deitava mais. Há quanto tempo? Esquecera de contar os dias, mas havia contado todas as horas e sabia que foram muitas!...
Mais um gole de vinho. Descia acre pela garganta. Queria a viscosidade do sangue, seus dentes cravados na carne dele. Queria gritos, pratos se quebrando numa briga, queria deles a mesma fúria da tempestade que caía lá fora. Mas a casa continuava em silêncio, os ponteiros do relógio avançavam. Ela permanecia calada, quieta, tentando desfazer o nó na garganta com mais um gole de vinho. Não adiantava. Nada mais. Nem mesmo a sua volta. Ela não queria.
Os pés descalços percorreram a casa no escuro, iluminada apenas pelos relâmpagos. Mais um cigarro. Uma fisgada na boca do estômago. Olhos secos, vítreos, fixos na janela. Sentia o vazio pesar como nunca imaginara que pudesse ser.
A campanhia soou junto com mais um trovão. Ele, do outro lado da porta, tão molhado quanto as ruas lá fora, uma mala na mão, o olhar ansioso. O som invadindo o precioso silêncio em que ela havia se colocado desde que ele se fora. O coração dele descompassado do outro lado da porta. Ela já nem tinha mais sangue correndo em suas veias. Não tinha sede, não tinha sono, não sabia que horas eram, só que era muito tarde. Tarde demais.
Mais um toque na campanhia. Um relâmpago. Um trovão. Achou melhor tentar dormir. Não recebia mais estranhos em casa.



Rosana


Outubro.2007
P/ Jean Luvisoto. Sempre. Abimo Pectore, pra sempre.

Um comentário:

Anônimo disse...
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