
Deixa em cima dessa mesa a foto que eu gostava
Pr'eu pensar que teu sorriso envelheceu comigo
Deixa eu ter a tua mão mais uma vez na minha
Pra que eu fotografe assim meu verdadeiro abrigo
Deixa a luz do quarto acesa e a porta entreaberta
O lençól amarrotado, mesmo que vazio
Deixa a toalha na mesa e a comida pronta
Só na minha voz não mexa, eu mesmo silencio...
Deixa o coração falar o que que calei um dia
Deixa a casa sem barulho achando que ainda é cedo
Deixa o nosso amor morrer sem graça e sem poesia
Deixa tudo como está e se puder, sem medo...
Deixa tudo o que lembrar, eu finjo que esqueço
Deixa e quando não voltar eu finjo que não importa
Deixa eu ver se me recordo uma frase de efeito
Pra dizer te vendo ir fechando atrás a porta
Deixa o que não for urgente e que eu ainda preciso
Deixa o meu olhar doente pousado sobre a mesa
Deixa ali teu endereço, qualquer coisa aviso
Deixa o que fingiu levar mas deixou de surpresa
Deixa eu chorar como nunca fui capaz contigo
Deixa eu enfrentar a insônia como gente grande
Deixa ao menos uma vez eu fingir que consigo
Se o adeus demora, a dor no coração se expande
Deixa o disco na vitrola pr'eu pensar que é festa
Deixa a gaveta trancada pr'eu não ver tua ausência
Deixa a minha insanidade, é tudo o que me resta
Deixa eu pôr à prova toda a minha resistência
Deixa eu confessar meu medo do claro e do escuro
Deixa eu contar que era farsa a minha voz tranquila
Deixa pendurada a calça de brim desbotada
Que, como esse nosso amor, ao menor vento oscila
Deixa eu sonhar que você não tem nenhuma pressa
Deixa o último recado na casa vizinha
Deixa de sofisma e vamos ao que interessa
Deixa a dor que lhe causei, agora é toda minha
Deixa tudo o que eu não disse mas você sabia
Deixa o que você calou e eu tanto precisava
Deixa o que era inexistente e eu pensei que havia
Deixa tudo o que eu pedia mas pensei que dava...
Oswaldo Montenegro
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