sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Do Vazio


Hoje trago os olhos vazios de promessas, cansados de fitar o cinza da ausência, de contemplar o deserto estendido diante de mim. Tudo é desolação e solidão. Minhas terras se tornaram extensões estéreis e áridas. Nada vinga no campo que deixaste à míngua. Nem flor nem erva daninha. Tudo vem morrendo à minha volta. Tudo o que um dia toquei, desfez-se como miragem, areia escorrendo por entre meus dedos e perdendo-se num tempo de nunca mais.
Meus pés seguem descalços, desaprenderam o rumo tão acostumados estavam em te seguir, jamais pensaram em trilhar outro caminho que não o mesmo que teus pés também descalços como pássaros num vôo em sincronismo. Hoje eles pisam cacos de tudo aquilo que ontem ainda era tão maior que eu mesma, era real, ontem ainda estava ali, eu mesma podia tocar, manter guardado à tua espera para que pudesse te escutar proclamando o fim da nossa clausura, repetindo o que sempre me fora sagrado ouvir, como se, ao me dizer, da tua boca saísse a certeza do final do meu caminho, o sentido, teu amor sempre fora meu maior e mais caro tesouro... Olho em volta e tudo ao meu redor é um monte de estilhaços pontiagudos que me ferem tão fundo por mais que eu permaneça imóvel neste quarto escuro em que me deixaste pra sangrar sozinha... Pra me olhar sozinha num espelho que não mais reflete tua imagem do outro lado. Coberta de cortes... Retalhada em postas... Nenhuma cicatriz... O sangue nunca vai parar de jorrar, vai continuar exposto espalhando o odor fétido de dor e desespero, um grito mudo, nó na garganta, olhos vítreos de quem morre por dentro e continua de pé. Os dias passam assim. Seguem sucedendo uns aos outros, formam os meses, vão tornar-se anos, são uma longa noite onde não existe mais o brilho dos teus olhos de som e cor pra me guiar. Sei que me perco mais e mais e nada há que eu possa fazer para ao menos me encontrar. Nenhuma fresta por onde eu poderia ter escapado nem mesmo há tempos atrás. Você ocupou todos os espaços, dentro e fora de mim.
Minhas mãos não se estendem mais pois conformaram-se com o vazio de não te encontrar. As lutas foram todas inglórias. Nenhuma vitória houve. Minha cama tornou-se uma lápide onde jaz meu corpo frio de nunca te saber ali. Lentamente, vou morrendo em asfixia pelo teu cheiro de sal e sol que invade meus pulmões. Sem tua pele morna sob meus dedos, eles foram se petrificando, tornaram-se mais uma parte morta de mim. Meus olhos, hoje vazios, de promessas e sonhos, de planos e esperança, fitam o nada, esperam pelo golpe de misericórdia. Esperam pelo fim.


Rosana 22.outubro.2009
Para Jean Luvisoto.

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